Economia

o que muda para o investidor

A combinação de duas propostas do governo federal deve mudar o cenário dos investimentos em renda fixa no Brasil. São elas o Imposto de Renda da Pessoa Física Mínimo (IRPFM), uma tentativa de ampliar a tributação dos mais ricos, e a taxação de aplicações que hoje são isentas de IR.

Oficialmente, o governo pretende elevar de zero para 5% o Imposto de Renda sobre os rendimentos de Letras de Crédito Imobiliário (LCI) e do Agronegócio (LCA) e Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI) e do Agronegócio (CRA), que vinham ganhando popularidade justamente por serem isentos de IR. Acontece que, com a aplicação do IRPFM mais adiante, na prática o imposto cobrado sobre tais aplicações pode até dobrar, chegando a 10% para os contribuintes de renda mais alta.

A criação do IRPFM está prevista no Projeto de Lei 1.087/2025, apresentado em março. Segundo o governo, a taxação servirá para compensar o aumento da faixa isenta de imposto para R$ 5 mil. A proposta está em tramitação na Câmara e espera-se que o relator, Arthur Lira (PP-AL), apresente seu parecer na segunda semana de julho. O governo conta com a aprovação do projeto ainda neste ano, para entrar em vigor no início do próximo ano.

A nova tributação de aplicações financeiras, por sua vez, foi estabelecida pela Medida Provisória 1.303, editada em 11 de junho. Embora a MP já tenha sido publicada, a cobrança de IR sobre as aplicações começa apenas em 2026, caso receba o aval do Congresso.

As aplicações de renda fixa em questão (LCIs, LCAs, CRIs, CRAs) ganharam força nos últimos anos por não terem tributação sobre os rendimentos. Segundo a B3, o volume aplicado em LCA cresceu 23,7% nos últimos 12 meses, chegando a R$ 584,8 bilhões nesta quinta-feira (26). As LCI aumentaram 30,2%, totalizando R$ 471,9 bilhões.

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Por que o governo quer tributar LCIs, LCAs e outras aplicações

O governo diz que as medidas buscam a justiça tributária: o ministro Fernando Haddad (Fazenda) vem repetindo que a ideia é tributar “morador de cobertura”. O Ministério da Fazenda estima que 141 mil pessoas, ou 0,06% da população, serão afetadas pelo IR mínimo sobre a alta renda.

Também existe a intenção, principalmente com a MP 1.303, de arrecadar mais recursos a fim de reduzir o déficit fiscal.

Apenas com a revogação da isenção sobre os títulos incentivados, a expectativa do governo é de arrecadar R$ 2,6 bilhões no próximo ano. A receita esperada com a instituição do IRPFM é de R$ 25,2 bilhões.

Perda de rentabilidade de LCI e LCA será maior para quem ganha mais

Quem ganha mais de R$ 50 mil mensais (R$ 600 mil por ano) sentirá mais o impacto nas aplicações financeiras, por causa do efeito da nova taxação sobre o futuro IRPFM. É esse impacto que pode fazer com que, em vez de 5%, a alíquota do IR sobre os investimentos chegue a até 10% na prática.

A ideia do governo com o IRPFM é fazer com que quem ganha acima de R$ 600 mil por ano pague um porcentual mínimo de Imposto de Renda. Essa alíquota começará próxima de zero e subirá gradualmente conforme a renda, chegando ao teto de 10% para rendas a partir de R$ 1,2 milhão ao ano.

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Pela proposta do governo, investimentos isentos de IR não entram na base de cálculo do IRPFM. Até pouco tempo atrás, portanto, o rendimento de aplicações como LCI e LCA não entraria na conta do IR mínimo. Com a MP 1.303, porém, tais letras deixam de ser isentas e entram na base de cálculo do Imposto de Renda dos mais ricos. E assim podem ser taxadas em até 10% no momento da aplicação do IRPFM, em vez dos 5% originais.

“A proposta tributa indiretamente esses investimentos ao incluí-los na base de cálculo do IRPFM”, diz Luís Garcia, sócio do Tax Group e do MLD Advogados Associados.

Hoje, um investidor com renda anual de R$ 900 mil – sendo R$ 600 mil em dividendos (atualmente isentos) e R$ 300 mil em rendimentos de LCI e/ou LCA – não paga impostos sobre esses ganhos. Com as mudanças, passaria a pagar R$ 30 mil em tributos.

Bruno Cazarim, tributarista do Gomez Cazarim Advogados, alerta: “A inclusão no IRPFM pode elevar a tributação efetiva para até 10%. Isso pode tornar produtos como CDBs ou debêntures tradicionais mais vantajosas em alguns casos”.

Os caminhos para os investidores

Especialistas apontam dois caminhos possíveis para os investidores:

Contestação judicial

  • Questionar a legalidade com base no princípio constitucional de que tributos só podem ser criados ou aumentados por lei específica
  • Alegar bitributação disfarçada ou violação à segurança jurídica

Garcia também aponta que haveria uma diferenciação de tratamento entre investidores com base na sua renda. Para Sidney Lima, analista da Ouro Preto Investimentos, “o risco é comprometer a confiança do investidor”.

Reestruturação de portfólio

  • Diversificar a carteira, reduzindo a exposição a títulos incentivados
  • Avaliar migração para previdência privada ou fundos exclusivos
  • Considerar estruturas patrimoniais como fundos fechados ou holdings

Medida pode causar fuga de capitais

Garcia adverte que as iniciativas do governo podem causar fuga de capitais do país, pois estimulam investidores a avaliar opções no exterior, onde o tratamento tributário pode ser mais previsível.

Outra necessidade é de um acompanhamento contínuo da tramitação da MP e do projeto de lei. As propostas ainda precisam ser votadas no Congresso Nacional. Há forte pressão de diversos setores econômicos por ajustes, o que pode resultar em modificações significativas no texto final e modificar as estratégias de planejamento tributário e de reestruturação do portfólio.

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