Economia

Haddad aponta culpados e assiste ao naufrágio de seu arcabouço

Foi-se o aumento do IOF. O Congresso “atropelou” Fernando Haddad, em uma votação que não deixa dúvidas sobre como está o clima para aumento de impostos e o relacionamento com o governo Lula.

O ministro, que já não andava contente, agora ameaça fazer novos bloqueios no Orçamento (coisas da vida), buscar outras fontes de receita (o Parlamento vai aprovar?) e recorrer ao STF para ressuscitar a alta do IOF (aqui parece haver chance de sucesso).

A obsessão por arrecadar mais é tamanha que um desavisado poderia supor que as receitas do governo estão em queda. Não é o caso. Bateram recorde em 2024 e continuam em alta neste ano, com avanço real de 4% até maio, conforme relatório publicado há pouco.

O problema de Haddad é dar conta das despesas. As que ele aceita cortar são poucas, e enfrentar as que mais pesam sempre esteve fora de questão. Ao contrário: Lula turbinou os gastos obrigatórios logo no início do governo. E, conforme se aproxima o ano eleitoral, vai anunciando bondades, como a multiplicação do Auxílio Gás. Ninguém ficará surpreso se vierem outras.

Mesmo que tenha sucesso em todas as suas futuras empreitadas arrecadatórias, Haddad não conseguirá, sem corte de gastos, cumprir o arcabouço fiscal que ele próprio criou há dois anos – e que batizou de “Regime Fiscal Sustentável”.

Isso porque o aumento de receita pode até ajudar a bater a meta de déficit ou superávit primário. Mas nada faz pelo cumprimento do limite de gastos. Conforme as regras do arcabouço, eles não podem crescer mais que 2,5% ao ano, em termos reais.

O governo tem conseguido andar no limite graças a algumas licenças (como pagar precatórios e outras despesas “por fora”) e à contenção das despesas discricionárias (“livres”), como o custeio da máquina pública e os investimentos públicos. Não vai funcionar por muito tempo.

Os furos aparecem aqui e ali. Para ficar em dois pequenos exemplos, acabou o dinheiro para fiscalizar a qualidade dos combustíveis e quase não há verba para abastecer os jatinhos da FAB, o que – se serve de consolo – obriga algumas autoridades a viajar em voos comerciais.

São apenas aperitivos do que pode ocorrer. Com os gastos obrigatórios tomando cada vez mais espaço dos livres e a volta dos precatórios à contabilidade oficial em 2027, logo não haverá despesas passíveis de corte.

Em projeção divulgada nesta semana, a Instituição Fiscal Independente (IFI) prevê “colapso da capacidade administrativa do Estado já a partir do próximo exercício”.

“Nos três cenários projetados [base, otimista e pessimista], o ritmo de crescimento das despesas obrigatórias e das despesas discricionárias rígidas [saúde, educação e emendas parlamentares] acaba por consumir todo o espaço fiscal disponível. Para os três cenários a insuficiência ocorre no ano de 2027”, diz relatório da IFI.

Conter os gastos obrigatórios exige mudar a legislação que rege essas despesas (a reforma da Previdência, sob Bolsonaro, foi um exemplo) ou limitá-las de outra forma (o governo passado não reajustou salários do funcionalismo e praticamente não repôs servidores aposentados).

Lula e o Congresso estão dispostos a isso? Desnecessário falar do ânimo do presidente. O Legislativo, por sua vez, acaba de aumentar o número de deputados e empurrar uma fatura de R$ 200 bilhões para o consumidor de energia pagar.

Haddad, que deveria ser o primeiro interessado, não apresentou e nem sequer prometeu qualquer agenda de revisão de gastos capaz de evitar o naufrágio de seu arcabouço. Parece dedicar mais tempo a apontar culpados – os outros.

A tarefa de criar um regime de fato sustentável ou uma nova engabelação ficará para depois da eleição. Como aliás já havia adiantado, sem traço de constrangimento, a ministra Simone Tebet. Que ao menos teve o mérito de reconhecer a existência do problema.

Fonte

Deixe um comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Artigos relacionados

Economia

Arrecadação de impostos bate recorde em maio e soma R$ 230 bilhões

A arrecadação de impostos federais em maio bateu recorde para o mês...

Economia

Governo pode recorrer ao STF para manter aumento do IOF

O ministro Fernando Haddad, da Fazenda, sinalizou que o governo pode recorrer...

Economia

Câmara confirma isenção do IR para até 2 salários mínimos neste ano

A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta (25) o projeto de lei...

Economia

Falta de dinheiro paralisa aviões da FAB e põe ministros na fila dos aeroportos

A Força Aérea Brasileira (FAB) reduziu a operação de aviões utilizados para...